Saber Profundo e as Bases do Seis Sigma
Seis Sigma

07 de setembro de 2016

Última atualização: 25 de janeiro de 2023

Saber Profundo e as Bases do Seis Sigma

O que é o saber profundo de Deming?


Saber Profundo de Deming: ao longo de sua carreira, e principalmente ao final, sintetizou os fundamentos de sua teoria da melhoria de processos no que ele chamou de Saber Profundo. O saber profundo é pautado em 4 pilares fundamentais:



Saber Profundo


Visão sistêmica


Devemos parar de enxergar uma organização como um aglomerado de pessoas, mas sim como um conjunto de processos que tem por objetivo cumprirem uma função. Assim como o artesão no passado, cada organização de pessoas deve transformar entradas em saídas, insumos em produtos e serviços menores em serviços maiores. Devido à complexidade adquirida pelos produtos e serviços modernos, observar esse objetivo da organização (ou esse propósito, como Deming preferia chamar) torna-se complexo. No dia a dia, como trabalhadores, pensamos muito em nossos departamentos e nossas atividades. Esquecemo-nos de enxergar como nosso trabalho se correlaciona com o trabalho das outras pessoas da empresa de maneira a entregar à sociedade o que ela espera de nossa organização.


Um exemplo que utilizo muito para ilustrar este conceito é o relógio. Qual é a valia de um relógio se não for para marcar os dias e as horas? Esta é a sua função principal e todas as engrenagens e seus movimentos devem estar alinhados com esta função. Alguém analisa a hierarquia das engrenagens de um relógio? Não que eu saiba, apenas são analisados os processos que cada peça executa para que o relógio marque as horas da maneira mais precisa possível. Assim deve ser uma organização.


Ter visão sistêmica é observar como cada parte da organização se correlaciona com as demais, permitindo a este sistema cumprir suas funções. Existem diferentes ferramentas para desenvolver essa visão, que serão exploradas ao longo do curso. Alguns exemplos são: SIPOC, fluxograma, VSM, entre outros.



Teoria do conhecimento


É impossível fazermos nossas atividades de maneira melhor se não aprendemos algo novo sobre o que estamos fazendo. Gerar conhecimento, do técnico ao processual, é de fundamental importância para aumentar o desempenho da organização. Em outras palavras: precisamos saber aprender. Esse aprendizado não pode ser feito a duras penas, na base da tentativa e erro. Precisamos ter um método para aprender melhor. É justamente disso que fala a teoria do conhecimento. Como aprender melhor como organização?


As ferramentas que nos ajudam a aprender, são aquelas criadas em cima do método científico, como o ciclo PDSA e o Planejamento de Experimentos. Mais a frente, exploraremos em detalhes como funciona o método e quais são suas etapas para gerar conhecimento de maneira rápida e sólida.



Entendimento da variação


Este pilar tem tudo a ver com as ferramentas estatísticas. Todos os processos e resultados de uma organização variam. Às vezes vendemos mais, às vezes menos, às vezes uma peça sai mais leve, outras mais pesada. Isso é perfeitamente natural e por mais que trabalhemos para reduzir essas variações, nunca acabaremos com elas. O problema é a maneira como reagimos a essa variação. Imagine se todos os meses que eu vendesse menos eu ficasse triste e começasse a tomar ações drásticas. Isso não necessariamente faria com que eu vendesse mais no mês seguinte. Porém, se houvesse uma causa clara para eu vender menos, se eu não tomar uma ação drástica sobre ela, meu negócio estará ameaçado.


Entender a variação é saber quando uma mudança no meu indicador é natural e quando ela não é natural (ou seja, tem algo novo e diferente no processo). As ferramentas estatísticas nos ajudam exatamente nesse quesito. Analisar o comportamento do indicador ao longo do tempo com essas ferramentas nos permite enxergar quando uma variação é significativa e quando ela é natural.



Psicologia


Organizações são compostas de pessoas, e pessoas tem sentimentos e ambições. Se não entendermos o que motiva cada um individualmente, dificilmente poderemos juntar os esforços individuais para atingir o propósito da organização. Esse entendimento é justamente a psicologia. Como disseminar o propósito de maneira que ele engaje continuamente cada membro da organização? Como trabalhar em equipe?


Para melhoramos nosso domínio deste pilar, existe algumas técnicas, principalmente referentes à comunicação e ao alinhamento de cada um. Discutimos estas técnicas com mais profundidade em nosso curso de Green Belt.



Como implementar?


O método do Modelo de Melhoria e os ensinamentos do Saber Profundo são extremamente robustos. Eles podem ser aplicados em qualquer tipo de organização, porém, possui alguns requisitos. Devemos preencher esses requisitos se desejamos alcançar o máximo de resultado com estes conhecimentos. São eles:


Entender melhoria como necessidade estratégica: a organização precisa realmente estar engajada no desenvolvimento de melhorias. É impossível conduzir projetos de melhoria (independente da metodologia), sem que sejam disponibilizados os recursos necessários à equipe. Por exemplo, como um funcionário irá dedicar-se a melhorar um indicador se ele não fizer parte da necessidade da empresa? Como um trabalhador poderá melhorar seu desempenho se não possui tempo ou foco para aprender sobre o que está fazendo? Se a direção da organização não prezar pela melhoria, esta não irá acontecer.


Dominar uma técnica de melhoria: isso é o que passaremos no curso de Green Belt, a técnica (um roteiro e várias ferramentas) para fazer a melhoria acontecer. Essa técnica deve ser dominada pelo agente que irá conduzir os esforços da equipe. Ele deverá atuar como um tutor conduzindo a equipe pelo roteiro e pelas várias ferramentas.


Criar uma estrutura favorável para a melhoria: por fim, as organizações, juntamente com o agente de melhoria devem torna-la um processo do dia a dia. Os operadores de cada atividade devem possuir os meios necessários para gerar novas melhorias. Isso vem do trabalho da organização em mudar e adaptar seu próprio ambiente.



Mudança e Melhoria


Um ponto central da ciência da melhoria é a sua relação com a mudança. Uma boa definição de insanidade é fazer sempre a mesma coisa e esperar por resultados diferentes. É impossível melhorar alguma coisa sem que se façam mudanças. Melhoria requer mudança. Entretanto, mudança nem sempre resulta em melhorias. Algumas mudanças, inclusive, pioram o desempenho de um processo, portanto, não utilize melhoria como sinônimo à mudança.


Esse conceito, apesar de parecer óbvio quando exposto dessa maneira, é traiçoeiro. Em nossa vida cotidiana, estamos acostumados a pensar sempre em mudar. É só observarmos as campanhas políticas que vemos em épocas de eleições: mudança, mudança, mudança! Poucos candidatos falam em melhoria. Por outro lado, em empresas, é comum nos depararmos com planos de ação em que o autor lista que encontrou 350 oportunidades de melhorias. Está errado. Ele encontrou oportunidade de mudanças, que serão ou não melhorias, cabendo ao tempo dizer isto. Então como desenvolver mudanças que tenham grande probabilidade de ser melhorias?


Há uma maneira fácil de estruturamos essas mudanças, por meio das três questões fundamentais da melhoria.



Três questões fundamentais


Responder as 3 perguntas fundamentais da melhoria nos dão o que precisamos para realizarmos um projeto de sucesso. As perguntas criam um mapa com:



O objetivo do esforço.


A primeira pergunta nos faz refletir sobre o que queremos realizar. Quando o objetivo é claro, nós podemos estruturar de maneira mais efetiva as nossas ações. Além disso, podemos usar a definição de objetivo para alinhar a nossa equipe.



As métricas do esforço de melhoria.


A segunda pergunta tem a ver com indicadores e métricas, ou seja, tem a ver com dados. Como saber que a nossa mudança foi uma melhoria? Precisamos de dados para isso! Se o nosso projeto de melhoria visa “diminuir os refugos na linha de produção”, só vamos saber que uma mudança foi uma melhoria quando medirmos a quantidade total de refugos ao longo do tempo e verificarmos uma queda. Definir claramente um indicador nos ampara na realidade e guia as nossas ações.



Quais mudanças podemos fazer?


A terceira pergunta nos ajuda a definir o escopo. Quais mudanças poderemos realizar para alcançar o nosso objetivo, ou seja, impactar nosso indicador? Várias vezes, a resposta para esta pergunta aparece ao longo do projeto de melhoria. Entretanto, tentar respondê-la no começo do projeto ajuda a equipe a entender um pouco também suas restrições. Quais mudanças não poderão ser feitas? Podemos contratar mais gente? Podemos colocar mais controles?


Antes de explorarmos mais a fundo cada uma dessas perguntas, precisamos fazer um comentário prático. As 3 perguntas podem ser respondidas de maneira iterativa, ou seja, não há uma ordem lógica para responde-las. Comece por qual pergunta preferir, apenas garanta que todas serão respondidas, mas a ordem é livre. Esta perguntas sintetizam a aplicação do Saber Profundo.


Gosto bastante de uma história relacionada a isso. Em uma empresa que tivemos a oportunidade de trabalhar, os funcionários propunham a todo o momento realizar mudanças no processo (e acho que isso não acontecia só lá). Muitas dessas mudanças eram iguais às mudanças dos políticos que comentamos anteriormente, ou seja, sem um foco claro definido. Algumas eram boas ideias, outras nem tanto, mas a grande maioria delas vinha embasada em problemas reais da organização.


Para não desperdiçar as boas ideias e nem deixar passar os problemas, propusemos um método: todas as mudanças seriam analisadas, contanto que para cada uma, as outras 2 perguntas fundamentais fossem respondidas.


Desta maneira, quando um funcionário pensasse em uma mudança, ele era forçado a entender o objetivo dessa mudança e a propor um indicador ou uma métrica para identificar se ela seria uma melhoria. O resultado foi fantástico. Assim que uma mudança surgia na cabeça do trabalhador, ele logo identificava o real objetivo dela. Com o objetivo claro na cabeça, ele podia aperfeiçoar a mudança ou até mesmo propor uma alternativa até melhor que a ideia original.



Faça um desafio.


Muitas empresas possuem um programa de sugestões em que os colaboradores que fornecem boas ideias são premiados. Foram poucas as vezes que vi tal programa resistir mais que alguns meses. A maioria gera muitas sugestões no início, mas depois são deixados de lado e esquecidos. Os motivos para isto são muitos, da falta de boas ideias até a falta de empenho da empresa em colocar em prática as sugestões recebidas. Diante disto, proponha o desafio de colocar as três questões no formulário de sugestões. Isto irá forçar os colaboradores a sugerirem ideias mais trabalhadas, com objetivo, indicador e sugestão de mudanças. E, ideias mais estruturadas tem grandes chances de serem boas, o que vai potencializar seu programa de sugestões e fazer com que os próprios colaboradores percebam a diferença e a força do programa.

Virgilio F. M. dos Santos

Virgilio F. M. dos Santos

Sócio-fundador da FM2S, formado em Engenharia Mecânica pela Unicamp (2006), com mestrado e doutorado na Engenharia de Processos de Fabricação na FEM/UNICAMP (2007 a 2013) e Master Black Belt pela UNICAMP (2011). Foi professor dos cursos de Black Belt, Green Belt e especialização em Gestão e Estratégia de Empresas da UNICAMP, assim como de outras universidades e cursos de pós-graduação. Atuou como gerente de processos e melhoria em empresa de bebidas e foi um dos idealizadores do Desafio Unicamp de Inovação Tecnológica.