Este artigo propõe um olhar diferente sobre a gestão. Através de uma parábola, a história da pequena indústria de tapioca, a "Tapioca Raiz", vamos analisar como desafios comuns do dia a dia podem ser resolvidos de forma estruturada. A narrativa funciona como um espelho para as dificuldades e oportunidades presentes em qualquer negócio.
A Parábola da Tapioca industrial e a eficiência
A "Tapioca Raiz" era uma pequena indústria familiar, fundada por Senhor Manuel, a fábrica produzia toneladas de goma para tapioca, mas nos últimos anos, encontrava dificuldades para crescer. Os processos, criados na época da fundação, nunca haviam passado por uma revisão séria.
Lotes inteiros eram frequentemente perdidos por problemas de fermentação no armazenamento. A máquina principal de ralar, antiga e desregulada, gerava uma textura de goma que variava a cada dia. Isso resultava em reclamações constantes de clientes importantes: ora o produto chegava seco demais, ora úmido demais. O desperdício de matéria-prima e os custos com devoluções eram encarados como "o custo normal do negócio".
O cenário começou a mudar com a chegada de Ricardo, neto de Seu Manuel, recém-formado em engenharia de produção. Ele não chegou com a intenção de mudar tudo de uma vez, mas sim de entender os porquês. Ricardo passava os dias no chão de fábrica com uma prancheta, observando o fluxo de trabalho e conversando com os operadores.
Suas perguntas eram simples e diretas:
"Por que usamos o lote de mandioca que chegou hoje em vez daquele que está armazenado há dois dias? O mais antigo pode estragar."
"E se instalarmos um medidor de umidade na saída da prensa? Poderíamos ajustar a pressão em tempo real para garantir a consistência do lote."
"Notei que a equipe do turno da manhã produz 10% a menos que a da tarde, usando a mesma máquina. Será que o procedimento de limpeza e ajuste entre os turnos está diferente?"
A desconfiança inicial dos funcionários mais antigos logo deu lugar à colaboração. Com base nas observações de Ricardo, eles redesenharam o layout do estoque para garantir o uso correto da matéria-prima. Passaram a medir a performance das máquinas e criaram um checklist de calibração diário. Ao analisar os dados de devolução, descobriram que a maior parte das reclamações vinha de um único problema na prensa. Ações corretivas foram implementadas.
Em poucos meses, a transformação foi nítida. O índice de desperdício caiu drasticamente. A qualidade do produto se tornou estável, o que fortaleceu a confiança dos grandes distribuidores e abriu portas para novos mercados. A "Tapioca Raiz" deixou de apenas sobreviver para finalmente planejar sua expansão.
A equipe da fábrica, liderada por Ricardo, aplicou os fundamentos do Lean Seis Sigma sem necessariamente usar os nomes formais. Eles se concentraram em eliminar o que não agregava valor (Lean) e em reduzir a variabilidade para entregar um produto confiável (Seis Sigma). A pequena indústria aprendeu que a melhoria contínua não era um projeto isolado, mas uma nova e lucrativa cultura de trabalho.
Da rotina à análise: os desafios da pequena indústria
Em muitas indústrias, especialmente as familiares como a parábola da "Tapioca Raiz", os processos produtivos são governados pela rotina. A maneira como as coisas são feitas foi estabelecida há anos e, por funcionar, raramente é questionada. Embora essa constância traga uma sensação de estabilidade, ela pode esconder ineficiências que limitam o crescimento e corroem a lucratividade.
Na fábrica da parábola, a produção seguia um fluxo conhecido por todos, mas essa familiaridade não garantia a eficiência. Problemas crônicos, como a perda de lotes ou as devoluções de clientes, eram tratados como eventos normais, parte do custo de operação. Faltava uma cultura de análise, um olhar que questionasse se a rotina estabelecida era, de fato, a melhor maneira de trabalhar.
O custo oculto do processo produtivo
O apego aos métodos antigos na "Tapioca Raiz" gerava custos que não apareciam nas planilhas. A perda de matéria-prima por má gestão de estoque e os gastos logísticos para lidar com devoluções são exemplos diretos. Estes desperdícios, quando não medidos, tornam-se invisíveis e são absorvidos pela operação como "normais".
Quando um sistema de produção opera sem um exame crítico, estes custos se infiltram na cultura da empresa. O verdadeiro desafio é trazê-los à luz, medindo e quantificando cada perda. É neste ponto que uma metodologia como o Lean Seis Sigma demonstra seu valor, pois transforma o que é apenas "rotina" em dados concretos para otimizar o uso de todos os recursos.
Variabilidade: o inimigo silencioso da qualidade
Além dos desperdícios evidentes, a fábrica enfrentava um problema mais sutil: a inconsistência. A qualidade final do produto não deveria ser uma surpresa a cada lote. No entanto, a falta de padronização em etapas como a calibração de máquinas gerava uma variabilidade constante no produto final entregue ao cliente.
Essa falta de uniformidade impacta diretamente a confiança do mercado e a reputação da marca. Sem um processo controlado, a qualidade se torna um acaso, não uma certeza contratada. Por isso, o combate à variabilidade é um dos focos de uma gestão industrial moderna. A excelência de uma operação está em sua capacidade de entregar um resultado previsível e de alto padrão, lote após lote.
Uma nova abordagem: a melhoria contínua
A transformação na "Tapioca Raiz" não começou com a compra de novas máquinas ou com grandes investimentos. Ela teve início com uma mudança de postura, representada pela chegada de Ricardo. A simples atitude de questionar a rotina e observar o processo com um olhar crítico foi o gatilho para a melhoria.
Essa nova abordagem substitui a aceitação passiva dos problemas pela investigação de suas causas.
Fase 1: medir para entender o cenário
O primeiro passo de Ricardo não foi dar ordens, mas sim fazer perguntas que levavam a uma conclusão: era preciso medir. Questionamentos como "por que o turno da manhã produz 10% a menos?" só podem ser respondidos com dados. A intuição e a experiência dos funcionários são valiosas, mas precisam ser confirmadas por informações.
O ato de medir tira a discussão do campo do "eu acho" e a traz para o campo dos fatos. Não se pode gerenciar ou melhorar aquilo que não se mede. Na prática do Lean Seis Sigma, essa fase envolve coletar dados sobre o desempenho do processo. Isso pode começar de forma simples, com planilhas e checklists, para criar um retrato fiel da situação atual e identificar onde estão os maiores gargalos.
Fase 2: analisar dados para encontrar a causa raiz
Com os dados em mãos, o passo seguinte é a análise. De nada adianta ter números se eles não forem transformados em informação útil. Na fábrica, Ricardo e a equipe analisaram os registros de devolução e fizeram uma descoberta, a maioria das reclamações de qualidade tinha a mesma origem, um problema específico na prensa.
Esta etapa é sobre investigar e encontrar a causa raiz dos problemas, em vez de apenas apagar incêndios. Ao focar na origem, as soluções se tornam muito mais eficazes e duradouras. A análise de dados permite que a equipe direcione seus esforços e recursos para os pontos que realmente gerarão impacto, evitando o desperdício de tempo com ações que não resolvem o problema de forma definitiva.
Os pilares da transformação na fábrica
O sucesso alcançado na "Tapioca Raiz" não foi um acaso. As melhorias implementadas por Ricardo e sua equipe são reflexos de dois pilares de gestão: os princípios Lean e do foco Seis Sigma.
Embora os funcionários da fábrica não usassem esses nomes, eles aplicaram a lógica da metodologia na prática. De um lado, buscaram um fluxo de trabalho mais limpo e rápido. Do outro, miraram na consistência e na qualidade do produto.
Princípios Lean: eliminando o que não agrega valor
O pensamento Lean é, em sua essência, uma caça ao desperdício. Ele propõe um olhar crítico sobre o processo para identificar e remover todas as atividades que consomem recursos mas não agregam valor ao produto final. O cliente não paga pelo tempo que a matéria-prima fica parada no estoque, por exemplo.
Na "Tapioca Raiz", a reorganização do estoque para evitar que a mandioca estragasse é uma ação Lean clássica. Aquela matéria-prima parada representava capital empatado e risco de perda. Ao otimizar o fluxo, a empresa reduziu custos e tornou a operação mais ágil. A filosofia é simples: focar no que é importante e eliminar o resto, tornando o processo mais eficiente.
Foco Seis Sigma: A Busca por um Padrão de Excelência
Se o Lean foca na velocidade e na eficiência, o Seis Sigma foca na qualidade e na precisão. Seu objetivo principal é reduzir a variabilidade dos processos para que o resultado final seja o mais consistente e previsível possível, com um número mínimo de defeitos.
A iniciativa de calibrar as máquinas diariamente e de medir a umidade da goma na fábrica é a aplicação direta do Seis Sigma. A causa da insatisfação dos clientes era a inconstância do produto. Ao atacar essa variabilidade, a "Tapioca Raiz" passou a garantir um padrão de qualidade, transformando a reputação da sua marca e a confiança do seu mercado.
Aplicando a lição da Tapioca em seu contexto
A história da "Tapioca Raiz" pode parecer específica, mas os desafios enfrentados por ela são universais. Toda empresa, independentemente de seu porte ou setor, possui processos que podem ser aprimorados. A lição deixada pela pequena fábrica é que a busca por eficiência e qualidade não é um luxo, mas uma alavanca para a competitividade e o crescimento.
Analisar o próprio negócio com o mesmo olhar crítico de Ricardo é o ponto de partida. Onde estão os desperdícios que se tornaram parte da rotina? Onde a variabilidade nos processos afeta a experiência do cliente? As respostas a essas perguntas podem nortear um caminho de transformação semelhante.
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