Fordismo: como este conceito ainda está presente?
Melhoria de Processos

21 de outubro de 2016

Última atualização: 25 de janeiro de 2023

Fordismo: como este conceito ainda está presente?

O que foi o Fordismo?


Fordismo: você sabe o que foi o Fordismo? Como aplicar este conceito em seu dia a dia? Hoje, gostaria de dar um enfoque mais profundo e filosófico no Fordismo. Sair do lugar comum dos livros de engenharia de produção e convidá-lo a uma reflexão mais profunda. Para isto, vou beber em algumas fontes diferentes. Para começar, gostaria de trazer a definição de Fordismo de Alain Lipietz. Em seu apogeu, o fordismo foi um modelo de industrialização, de acumulação e de regulação.




...combinação de formas de ajuste das expectativas e do comportamento contraditório dos agentes individuais aos princípios coletivos do regime de acumulação...


O paradigma industrial incluía o princípio tailorista da racionalização, juntamente com a constante mecanização. Essa “racionalização” baseava-se na separação dos apectos intelectual e manual do trabalho... o conhecimento social sistematizado a partir de cima e incorporado ao maquinário pelos projetistas. Quanto Taylor e os engenheiros tailoristas introduziram esses princípios no começo do século XX, seu objetivo explícito era forçar o controle da administração sobre os trabalhadores.



Zygmunt Bauman diz que o fordismo era mais que isso. Era um local epistemológico de construção sobre o qual se erigia toda uma visão de mundo e a partir da qual ele se sobrepunha majesticamente à totalidade da experiência vivida. O modo como os seres humanos o mundo tende a ser sempre praxeomórfico: é sempre determinado pelo conhecimento do dia, pelo que as pessoas podem fazer e pelo modo como usualmente o fazem.



Como era a fábrica no Fordismo?


A fábrica do fordismo – com a meticulosa separação entre projeto e execução, iniciativa e atendimento a comandos, liberdade e obediência, invenção e determinação, como o estreito entrelaçamento dos opostos dentro de cada uma das oposições binárias e a sua transmissão de comando do primeiro elemento ao segundo, foi sem dúvida, a maior realização até hoje da engenharia social orientada pela ordem.


Nesta época do capitalismo das indústrias pesadas, havia uma obsessão por volume e tamanho, e, por isso, também por fronteiras, fazendo-as firmes e impenetráveis. A sacada genial de Henry Ford foi a descoberta do domo de manter os defensores de sua fortaleza industrial dentro dos muros – para guarda-los da tentação de desertar ou mudar de lado. Zygmnunt cita Daniel Cohen para lembrar uma passagem interessante que mostrava o início da perda do poder de Ford:




Henry Ford decidiu um dia “dobrar” os salários de seus trabalhadores. A razão (publicamente) declarada, a célebre frase “quero que meus trabalhadores sejam pagos suficientemente bem para comprar meus carros” foi, obviamente, uma brincadeira. As compras dos trabalhadores eram uma fração ínfima de suas vendas, mas os salários pesavam muito mais em seus custos... A verdadeira razão para o aumento dos salários foi a formidável rotatividade de força de trabalho que o Ford enfrentava. Ele decidiu dar o aumento espetacular aos trabalhadores para fixa-los à linha...



A corrente invisível que prendia os trabalhadores a seus lugares e impedia sua mobilidade era, nas palavras de Cohen, “o coração do fordismo”. O rompimento desta corrente foi também o divisor de águas decisivo na experiência de vida, e se associa à decadência e extinção acelerada do modelo fordista.



Nos dias de hoje


Quando li estas referências, algumas coisas ficaram claras para mim. A minha visão do Fordismo dos livros de engenharia de produção, que focava apenas na racionalização do trabalho, não explicava sua queda. Por mais que as sátiras do filme “Tempos Modernos” mostrasse os aspectos negativos da alienação dos trabalhadores, o detalhe de como amarrar os trabalhadores àquela condição, não era por mim compreendido.


E, enxergar que o Fordismo é uma das causas da alta rotatividade em algumas empresas, explica muita coisa. Até hoje, pelo menos no Brasil, podemos enxergar empresas cuja lógica do Admirável Mundo Novo se fazem presentes. Há o comando claro e os comandados, quem pensa e quem executa e, olhando para isto, pergunto-me: o que faz com os colaboradores aceitem esta condição? Qual é a corrente moderna do trabalhador à máquina (ou aos processos)?


Respondendo esta questão baseando-nos somente no “achismo”, facilmente diríamos que era o salário. Em alguns casos, apenas o salário não dá conta e, adiciona-se o bônus. Mas mesmo com o bônus, depois de alguns anos e de ter o suficiente para a sobrevivência, a corrente financeira começa a se enfraquecer. Diante deste caso, dois cenários são possíveis: ou a pessoa pede demissão e vai fazer algo que faça sentido em sua vida, ou acaba caindo em tentações de gastos que irão fortalecer as correntes enfraquecidas e mantê-la presa.



O novo profissional


Crise econômica, gastos fora de controle e baixa qualificação, ao meu ver, são as situações causadoras deste arrocho nas correntes. Como a crise econômica não é evitável, defendemos o controle de gastos domésticos e a formação contínua do indivíduo. Quando fazemos apologia ao Green Belt, Black Belt, Lean, Gerenciamento de Projetos e demais formações que oferecemos, não estamos apenas ofertando um produto. Temos como crença que estamos aumentando a robustez da vida profissional da pessoa, pois alguém que domine tais conhecimentos dificilmente estará preso as amarras do Fordismo.


Algumas empresas reclamam do alto índice de rotatividade destes profissionais, mas ao investir numa formação robusta, o profissional torna-se plural. Ele consegue dedicar ao projeto que faz sentido a ele naquele momento, adaptando-se a esta modernidade líquida e fluída em que vivemos. E, ao certificar-se Green Belt, por exemplo, este profissional aprende a aprender. Por meio do Ciclo PDSA e da teoria do conhecimento, este profissional torna-se indispensável para este mundo de muitos desafios e poucas certezas.


Por mais que grandes empresas ainda sobrevivam dobrando salários, por meio do bônus e mirando grandes volumes, tal qual faziam na época do fordismo, não há certezas no longo prazo. O plano de carreira, tão reconfortante em outras épocas, não se aplica mais as empresas de hoje. Quem começa uma carreira numa empresa do capitalismo leve (serviços), não sabe onde e nem como ela irá terminar. Neste cenário, o profissional que sabe aprender e ser robusto para enfrentar diferentes desafios, é o mais buscado pelas novas empresas de crescimento rápido e oportunidades abundantes.

Virgilio F. M. dos Santos

Virgilio F. M. dos Santos

Sócio-fundador da FM2S, formado em Engenharia Mecânica pela Unicamp (2006), com mestrado e doutorado na Engenharia de Processos de Fabricação na FEM/UNICAMP (2007 a 2013) e Master Black Belt pela UNICAMP (2011). Foi professor dos cursos de Black Belt, Green Belt e especialização em Gestão e Estratégia de Empresas da UNICAMP, assim como de outras universidades e cursos de pós-graduação. Atuou como gerente de processos e melhoria em empresa de bebidas e foi um dos idealizadores do Desafio Unicamp de Inovação Tecnológica.